O Instituto Brasileiro de Previdência Social (IBDP) criticou nesta terça-feira (22) a Medida Provisória 871, assinada por Jair Bolsonaro, na última sexta-feira, que prevê cortes de benefícios de assegurados do INSS.
Através de uma nota técnica, o instituto afirma que o programa de revisão de irregularidades (vulgo pente-fino) “inverte o que prevalece no Direito brasileiro sobre a presunção de boa-fé” e coloca todos os aposentados “na condição de potenciais fraudadores da Previdência Social”.
“O Programa de Revisão em tela, popularmente conhecido como Pente-Fino, deve ser entendido criticamente. Não se deve acobertar ou deixar impune qualquer tipo de fraude, mas a MP 871 inverte o que prevalece no Direito brasileiro sobre a presunção de boa-fé, e coloca todos os aposentados e aposentadas na condição de potenciais fraudadores da Previdência Social. As fraudes e irregularidades devem ser enfrentadas, mas esse modelo que presume a má-fé dos aposentados não pode ser admitido”, diz a nota técnica IBDP N. 01/2019 sobre a MP 871/2019, publicada na ter-ça-feira (22).
A medida provisória prevê que quando houver indícios de irregularidade ou erros materiais na concessão, na manutenção ou na revisão do benefício, o INSS notificará o beneficiário para apresentar no prazo de 10 dias a sua defesa ou documentos, sendo estes enviados todos por via eletrônica. No caso da não apresentação no prazo ou a defesa ser considerada insuficiente, ou improcedente, o beneficio será suspenso e o INSS lhe dará 30 dias para recorrer da decisão.
Para o instituto, essa modalidade de procedimento é inconstitucional, porque o afronta art. 5º, inciso LV, da CF, que dispões sobre o devido processo legal: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
O prazo para a apresentação da defesa “é exíguo”. Os aposentados nem sempre estão na posse de todos os documentos que foram utilizados para sua aposentadoria. E esse prazo não viabiliza uma comunicação adequada com a empresa onde trabalhou, com o escritório que o aposentou, etc…”.
Pela MP de Bolsonaro serão 2 milhões de benefícios (pensões por morte, aposentadorias rurais e auxílios-reclusão) que passarão pelo crivo de analistas e peritos do INSS – que, de acordo com a medida, passarão a receber pagamento de Bônus pela cassação de benefícios considerados irregulares.
“O pagamento de Bônus aos Analistas e Técnicos do INSS, bem como aos médicos Peritos parece se dar apenas quando há cassação de benefícios considerados irregulares. A MP 871 não deixa claro se os servidores ganharão mais do que sua remuneração habitual se reanalisarem procedimentos administrativos e os benefícios restarem mantidos. Se o pagamento do Bônus representar pura e simplesmente incentivo financeiro para cassação de aposentadorias está-se diante de hipótese de violação do princípio da moralidade (art. 37, caput, da CF), visto que a Administração Pública deve agir com lealdade e boa-fé para com os administrados”, denuncia o IBDP.
Para o IBDP o conceito de benefício previdenciário com indício de irregularidade trazido pelo governo “é muito elástico e não proporciona segurança jurídica”. O que trás maior preocupação para o instituto é o 8º, inciso VI, que simplesmente dispões “processos identificados como irregulares pelo INSS (sic)”.
“… muito genérico, indicando que serão reanalisados benefícios identificados pelo INSS como irregulares. É sabido que há grande divergência na interpretação da legislação previdenciária: entre o INSS e o Poder Judiciário; dentro do âmbito do INSS, comparativamente entre suas regiões, supervisões, agências e até mesmo entre seus servidores. Teme-se que essa diversidade de interpretações possa ensejar a revisão de benefícios concedidos regularmente, a partir de outra interpretação administrativa”.
A MP 871 não menciona expressamente o cabimento do reexame de benefícios previdenciários concedidos a partir de decisão judicial. Caso isso ocorra, a exemplo do que o INSS pôs em prática com as Medidas Provisórias 739 e 767, em relação aos benefícios por incapacidade, poderá haver ofensa à garantia constitucional da coisa julgada.
O IBDP conclui o documento lembrando que a “Previdência Social é um importante instrumento de redução das desigualdades no país e meio indispensável de distribuição de renda para muitos” e clama para que a Constituição Federal “seja efetivamente respeitada”.
ANTÔNIO ROSA
Leia na integra: Nota técnica IBDP N. 01/2019 sobre a MP 871/2019.